Fernando Meireles e João Feres Júnior
O texto principal da reforma da Previdência foi aprovado na Câmara dos Deputados sem grandes surpresas. Partidos opositores do governo, apesar de defecções, votaram em peso contra a reforma, mas foram derrotados por 379 votos pela aprovação em primeiro turno da PEC 6/2019. Esse resultado elástico esconde, no entanto, uma série de 27votações nominais que ocorreram na sessão de aprovação do texto, no dia 10 de julho.
Para avaliar o posicionamento dos 513 parlamentares em relação à reforma da Previdência, analisamos no âmbito do Observatório do Legislativo Brasileiro todas as 27votações. Utilizamos para isso uma metodologia que permite colocar cada parlamentar em uma escala de apoio à reforma, de -10 a 10: deputados com pontuações maiores tiveram atuação mais favorável à reforma; já as notas menores indicam atuação contrária.[1]
Nosso estudo mostra que houve diferenças nítidas entre parlamentares e partidos, como mostra o gráfico abaixo. Nele, cada parlamentar é representado por um ponto e a escala horizontal indica sua pontuação, com pontos mais à direita indicando posicionamentos mais pró-reforma. Quando mais distantes um do outro, mais dois parlamentaresdivergiram.
Embora a maioria do plenário tenha votado a favor do texto final, esse apoio variou ao longo da sessão. Nas votações de alguns requerimentos feitos pela oposição, a maioria pró-reforma chegou a ter menos de 300 votos ao passo que, em outras, passou dos 400. O grupo grande de parlamentares próximos uns dos outros no centro da escala dográfico reflete esses posicionamentos cruzados. Aécio Neves (PSDB-MG), por exemplo, não entregou tanto apoio à reforma quanto o Pastor Marco Feliciano (Podemos-SP).
Nos extremos, a Deputada Adriana Ventura (NOVO-SP) e o Deputado Leonardo Monteiro (PT-MG) foram os que mais atuaram a favor e contra a reforma nas votações nominais, respectivamente. Além disso, é possível ver que a polêmica em torno da Deputada Tábata Amaral (PDT-SP) é, em grande parte, exagerada. Como indica o gráfico, ela aparece maispróxima de parlamentares da esquerda do que da direita, que apoiaram a reforma, ainda que tenha de fato votado a favor da aprovação do texto principal.
E os partidos, como se posicionaram? Com a nossa metodologia, também é possível visualizar claramente essa informação. No gráfico abaixo, PT, PCdoB e PSOL formaram um bloco bastante disciplinado na oposição à reforma, seguidos de PSB e PDT. Ao longo da escala, temos os demais partidos que ficam dispostos mais ou menos no centro da escala. Oque mais chama a atenção é o posicionamento do NOVO, que o foi o partido que em média entregou mais apoio à reforma, bem mais que o próprio partido do presidente, o PSL. Entre os membros do Novo, os deputados Paulo Ganine (RJ), Lucas Gonzales (MG), Tiago Mitraud (MG) e Marcel van Hattem (RS) aparecem na lista dos parlamentares com preferências mais intensas pela reforma, além da já citada Adriana Ventura.
O comportamento parlamentar é ainda pouco compreendido pelo público em geral. Em parte, isso se deve à complexidade dos procedimentos regimentais. Há, contudo, maneiras de traduzir essas informações de maneira a torná-las compreensíveis sem ao mesmo tempo apelarmos para grandes simplificações.
Fernando Meireles - Doutor em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e Pós-Doutorando no IESP-UERJ. É pesquisador do Centro de Estudos Legislativos (CEL/UFMG). Tem experiência nas áreas de Política Comparada, Instituições, Estudos Legislativos e Métodos Quantitativos aplicados às Ciências Sociais, com ênfase em inferência causal.Atualmente, pesquisa a política distributiva de governos de coalizão na América Latina.
João Feres Jr. - Coordenador do Laboratório de Estudos de Mídia e Esfera Pública (LEMEP), possui graduação em Ciências Sociais e mestrado em Filosofia pela Universidade Estadual de Campinas e mestrado e doutorado em Ciência Política pela City University of New York, Graduate Center.
Ambos são pesquisadores do Observatório do Legislativo Brasileiro (olb.org.br), que combina expertise acadêmica e ferramentas de análise de dados para acompanhar e avaliar o comportamento dos parlamentares no Congresso Nacional. São produzidas informações substantivas para organizações da sociedade civil e cidadãos sobre a tramitação e aprovação de políticaspúblicas, promovendo a transparência da atividade legislativa.
[1] Os votos de todos(as) os(as) parlamentares foram extraídos do serviço de Dados Abertos da Câmara dos Deputados. Para produzir os índices de posicionamento, utilizamos um método para extrair dimensões latentes das votações conhecido como Teoria de Resposta ao Item.
Assessoria OLB - Observatório do Legislativo Brasileiro
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